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14 de janeiro de 2010

Fala que eu (não) te Escuto

Não sei como são as pessoas onde você mora, mas na cidade onde vivo já há 6 anos, elas são carentes de atenção. E isso não é uma generalização, é apenas a constatação de uma característica do povo dessa parte do país. Em todo e qualquer lugar onde você for, aqui em Itaperuna (noroeste do Rio de Janeiro, quase na fronteira com Minas Gerais e Espírito Santo), será possível ver/ouvir alguém puxando conversa. Do nada.

Pode ser que eu seja apenas antipático, pode ser, mas fico muito incomodado com essa coisa da conversa que as pessoas têm por aqui. Vamos dar um exemplo simples. Digamos que uma senhora tenha uma consulta marcada com um médico. Digamos que ela chegue dois minutos atrasada. A probabilidade de ela chegar falando - com a secretária primeiro, para depois repetir para o doutor - que se atrasou porque "a minha filha esqueceu a chave, aí eu tive que voltar para abrir a porta pra ela, coitada" é de 98%. Os outros 2% correspondem à chance dela dizer que "a fila do banco estava muito grande, e ninguém merece ficar em pé esperando, e aquele banco é muito demorado, e eu vou colocar aquele banco na justiça".

Eu, como trabalho em um banco, posso dizer com propriedade isso. O número de pessoas que, todos os dias, vêm pagar contas e relatam (às vezes mais detalhadamente do que qualquer um gostaria de saber) as mazelas de suas vidas é imenso. Hoje, uma mulher de aproximadamente 40 anos veio pagar uma conta de luz, uma mísera conta de luz, e eu já sei que o filho dela estuda fora, que o marido dela está encostado no INSS e que o pagamento dele está atrasado. E eu ali, olhando pra ela com uma cara de paisagem que só eu sei fazer e pensando "whatever, mulher, whatever".

Uma que nunca falha é quando alguém vem pedir informação. As pessoas aqui não sabem só perguntar "onde tem um cartório aqui perto?". Elas perguntam "onde tem um cartório aqui perto?" e já mandam um combo com "é que eu preciso fazer uma declaração de não-sei-o-quê pro meu cunhado, que vai receber um dinheiro pra mim". E você ali, olhando, divagando.

Pensando nisso, abrindo os olhos para essa triste realidade, percebi que sim, as pessoas estão carentes de atenção. Todo mundo gosta de ser ouvido. Mas com a correria cotidiana, com os relacionamentos entre colegas de trabalho ficando cada vez mais superficiais, e com a própria intimidade entre os cônjuges (para quem é casado) ameaçada pela extensa carga horária do trabalho, ninguém tem mais tempo para conversar direito. Ninguém mais vai tomar uma Coca-Cola gelada e bater papo à toa.



Com o ritmo que o mundo acabou tomando, o tempo livre para as conversas está realmente escasso. Então, para compensar, as pessoas vão gastando suas cotas diárias de conversa com quem passar pela frente. Pode ser o frentista do posto, o barbeiro, o caixa do banco... Não importa. O que interessa mesmo é que todos querem, no fundo, se sentir ouvidos, sentir que alguém está entendendo aquilo que estão dizendo.

Gosto muito de observar esse tipo de detalhe, e até já aprendi a identificar a turma do small talk. O small talker (ou caça-assunto, em bom português) é aquele tipo de pessoa que entra num lugar e fica olhando para todos os lados, procurando alguém conhecido. Se encontrar, beleza, a conversa já está garantida. Se não encontrar... Aí, meu amigo, ele vai à caça. O primeiro que cruzar olhares com ele já era. "Quente, né? Nossa, com esse calor, não dá pra gente fazer nada. Porque o meu cunhado...". Sempre tem um cunhado no meio.

As pessoas estão, cada vez mais, atrás de atenção. Todo mundo gosta de se sentir importante, não é mesmo? E ouvir alguém, mesmo que não querendo fazê-lo, passa a essa pessoa uma sensação de que ela é importante a ponto de você parar o que está fazendo para escutar o que ela está dizendo. Isso, claro, são as minhas interpretações, eu que nunca estudei nada de Psicologia nem nada. E, pensando nisso, acabei fazendo uma outra relação, meio sem querer: não seria o blog uma espécie de small talk com alcance maior? Eu, por exemplo, escrevendo aqui. Não estaria eu falando para ninguém, na esperança de alguém perder um pouquinho de seu precioso tempo lendo esse texto? Fica a pergunta no ar. 

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