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23 de julho de 2010

Velhos Tempos

Quando eu tinha oito anos de idade, a vida era boa. Treinava meu karatê descompromissado, ia para a escola, jogava videogame, assistia televisão e, de vez em quando, dava um passeio ou outro com meu pai. Não, quando eu tinha doze anos é que a vida era boa. Ia para a escola, assistia televisão, jogava videogame... Não, espera, quando eu tinha 15 anos é que a vida começou a ficar boa: comecei a sair à noite com meus primos e amigos mais velhos, aprender música, ver televisão, jogar videogame, escola. Dezoito anos. Com 18 anos é que a vida era boa. Faculdade, vida noturna intensa, banda, trabalho, televisão, videogame.
Uma tendência natural que nós, pessoas humanas (adoro esse pleonasmo), temos é o de achar que o que passou era melhor do que o que estamos fazendo/vivendo/presenciando. Quem nunca ouviu e/ou falou algo como “na minha época é que era bom”? Alguns, inclusive, dão aquela entonação arrogantemente superior a essa frase, como se o fato de alguma coisa ser nova já a desabonasse logo de cara. Música, cinema, arquitetura, comida e principalmente comportamento... Em tudo isso, é possível dizer que algo já foi melhor um dia.
"Na minha época é que os telefones eram bons"
Prestando atenção aqui e ali – este, aliás, é um passatempo que carrego comigo há muitos anos, o de identificar minúcias da vida alheia e tentar tirar algo interessante disso -, percebo que muita gente não consegue reconhecer os méritos de algo enquanto o está vivendo. A tendência natural é dar valor ao que já passou, pois já vimos seus prós, seus contras, suas consequências... Mas, ao fazer isso, abrimos mão do que pode ser até mais valioso do que o que já passou: aproveitar o passeio. Sabe aquela história de que o que vale na viagem não é a chegada, mas a própria viagem, o percurso? É isso.
Sentir saudade de boas experiências é normal e até saudável, arrisco. Prejudicial mesmo é deixar de aproveitar a vida por achar que nada nunca será tão bom quanto um dia foi. Um exemplo bobo disso aconteceu comigo. Adorava comprar roupas em uma loja. Quando essa loja fechou, me senti órfão. Um dia, resolvi entrar em outra porque gostei de alguma coisa na vitrine, mas bateu aquela sensação de que nada ali seria tão bom quanto era na outra. Fui embora sem comprar nada.
Quando eu era criança, a vida era boa. Claro que era. Não tinha preocupações além de tirar boas notas na escola. Na minha adolescência, a vida era muito boa. Conheci muita coisa nesse mundo e vi que nem tudo é o que parece ser. Quando virei adulto, a vida também era boa. Os cabelos estão indo embora, é verdade, mas a vida continua boa. Embora reconhecer isso durante a jornada seja um pouco complicado (outra especialidade deste que vos escreve é a de perceber mais o lado negativo do que o positivo das coisas), o negócio é continuar tentando prestar atenção na viagem e esquecer um pouco o resto.   

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